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Débora Miranda

Brasileira sensação nos EUA diz: nova geração pode mudar basquete feminino

Débora Miranda

31/05/2018 05h00

Nesta época do ano é sempre a mesma coisa: chegam os playoffs da NBA e todo o mundo se mobiliza em torno disso. Nesta quinta (31) acontece o primeiro dos sete jogos da final e não tem um amante de esporte que não seja Warriors ou Cavaliers desde criancinha.

O mesmo esporte, no entanto, não desperta tanta mobilização quando se trata da liga nacional. Não há investimento, os resultados da seleção nos últimos anos não foram bons e o interesse do brasileiro pelo basquete foi minguando.

Cinco atletas brasileiros jogaram na NBA nesta temporada. E os talentos do basquete estão cada vez mais cedo saindo do Brasil, formando-se em times do exterior –a maior parte nos EUA– e conquistando espaço por lá. Apesar de muitos ainda sonharem com a seleção e com um título olímpico.

Izabela Nicoletti, 18 anos, é considerada a joia do basquete feminino brasileiro (Arquivo Pessoal)

Pois o basquete feminino está percorrendo exatamente o mesmo caminho. E um dos principais nomes brasileiros que já brilham em terras norte-americanas é Izabela Nicoletti, 18 anos. Ela acabou de entrar na universidade e vai cursar "sports management", uma espécie de administração esportiva, na Florida State University, onde ganhou bolsa de 100% para estudar enquanto joga pela equipe da escola.

Natural de Americana, no interior de São Paulo, Iza, como é conhecida, joga pela seleção brasileira desde os 13 anos e se mudou para os Estados Unidos com 14, depois que a base do Unimed-Americana acabou. Entre os momentos mais importantes de sua carreira está a partida em que a seleção brasileira sub-16 venceu a norte-americana pela Copa América, em 2015 –os EUA nunca haviam perdido uma partida no sub-16 e Iza foi a cestinha do jogo, com 24 pontos. Mais recentemente, ela ainda foi escolhida para participar do McDonald's All-American Game, uma partida disputada pelas 24 melhores atletas do Ensino Médio dos Estados Unidos inteiro.

A jogadora sensação, diz, no entanto, que sonha com o retorno para casa. "Uma das razões pelas quais eu fui para os Estados Unidos é para conseguir ajudar o Brasil. O meu sonho é poder voltar para cá e representar a seleção brasileira. A nova geração tem potencial para mudar o basquete brasileiro", afirma.

Nesta entrevista exclusiva ao "Extraordinárias", ela conta como se apaixonou pelo esporte aos 4 anos, fala das dificuldades de morar fora, longe da família, e do seu maior sonho: conquistar uma Olimpíada representando seu país.

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O projeto de base da Unimed-Americana acabou quando você tinha 14 anos. Como foi essa transição para os Estados Unidos?

Eu nasci em Americana, e minha irmã e minha prima sempre jogaram nas categorias de base da Unimed. Eu ia assistir aos treinos e aos jogos, era bem pequenininha, tinha 4 anos, e ficava na arquibancada imitando tudo o que elas faziam na quadra. E foi assim que comecei a gostar do basquete. Aí a técnica me chamou, e eu comecei a praticar, aos 5 anos. A Unimed para mim era um sonho. O time adulto era muito bom, e tudo o que eu queria era jogar lá. Mas, quando eu fiz 14 anos, a equipe da minha idade acabou. Então, a [técnica] Anne Freitas nos falou sobre um projeto de intercâmbio para os Estados Unidos. Ela conversou com a minha família, disse que era uma oportunidade boa de aprender inglês e jogar. A princípio eu ficaria lá por oito meses, era só para conhecer.

Mas você acabou ficando mais…

Fui para a Carolina do Norte e, lá, jogamos vários campeonatos. Éramos em seis brasileiras. Uns dois meses antes de irmos embora, um técnico de lá nos convidou para ficar. Disse: 'Vocês são boas! Acho que se ficarem aqui vão ter sucesso e grandes chances de ir para a universidade'. Ele disse que teríamos que pagar a escola, mas poderíamos morar em casas de famílias americanas. Então, ele viajou para o Brasil, conversou com a minha família, e minha mãe falou: "Se é isso que você quer, então vai".

Você sempre teve apoio da sua família? Ou no começo sentiu alguma resistência?

Minha família sempre me apoiou. Meu pai e minha mãe mudaram a vida deles para conseguir me dar o que eu queria, para que eu pudesse realizar meus sonhos. Eles tiveram que trabalhar muito e fizeram sacrifícios para me ajudar.

Como foi viver longe da família assim tão nova?

Eu sempre tive isso de "esse é o meu sonho e vou pular de cabeça". Mas, mesmo assim, quando cheguei lá, eu tomei um susto. Não falava nada de inglês, o que no começo foi difícil. Não sabia pedir um copo de água. Eu adoro falar, contar piada, e não conseguia dizer nada. Nos três primeiros meses, eu ligava para a minha mãe e falava que queria ir embora. Eu sofri com a distância da minha família, e até hoje sinto saudade. Mas é aquela coisa: tem que se sacrificar para chegar aonde se quer.

Iza começará em junho a treinar na Florida State University e sonha com a WNBA (Arquivo Pessoal)

E agora você está de mudança para a Flórida?

Eu vou me mudar em junho, agora. Lá na Flórida fica a universidade, onde ganhei 100% de bolsa. Vou morar em um apartamento com uma amiga que joga no meu time e vou estudar sports management, algo como administração esportiva. A expectativa é muito grande e tentarei dar o meu melhor para conseguir o meu espaço. Acho que enfrentarei algumas dificuldades, pelo fato de que todo o mundo que está lá joga no mesmo time durante os quatro anos de faculdade. Então, algumas meninas do meu time já estão no terceiro e no quarto anos, ou seja, são muito mais experientes. Mas estou confiante de que vou fazer sucesso no primeiro ano. Se não for no primeiro ano, no segundo.

Quem te inspira no basquete?

Tem várias pessoas. A Damires e a Érika, por exemplo, que fazem muito sucesso lá nos EUA. Meu sonho é chegar numa WNBA [a liga feminina de basquete profissional americana], então, ver brasileiras lá é muito legal. Gosto muito também da Diana Taurasi. Se eu tenho que jogar igual a alguém, quero jogar como ela.

Qual foi a sua maior realização até agora?

Eu tenho duas. A primeira foi quando a seleção brasileira ganhou dos EUA, no México [na Copa América Sub-16, em 2015]. Isso mudou a minha carreira, mudou a minha vida completamente. A notícia correu nos EUA, todo o mundo ficou sabendo desse time do Brasil. Fizeram um vídeo do meu jogo na internet e foi isso que levou os técnicos americanos de universidades a me conhecer. A outra foi ter jogado o McDonald's All-American. Nunca na minha vida eu esperava disputar um torneio entre as 24 melhores atletas do EUA.

Como você vê o basquete feminino no Brasil?

Uma das razões pelas quais eu fui para os Estados Unidos é para conseguir ajudar o Brasil. O meu sonho é poder voltar para cá e representar a seleção brasileira. Acho que essa geração tem um potencial muito grande para mudar a história do basquete brasileiro. Temos a Érika, a Damires e a Clarissa, que estão jogando fora do país, além de outras meninas da minha idade. Lá nos EUA é tudo em torno do basquete, aqui é outra história. O esporte não tem apoio nenhum, não tem incentivo. No Brasil, hoje, é só futebol. Mas eu acho que depende de nós mudar isso. Se conseguirmos ganhar jogos, vamos colocando o basquete brasileiro em um nível mais alto.

Quais são seus sonhos agora?

O meu maior sonho é acabar estes quatro anos de curso, ser campeã pela universidade e, se Deus quiser, jogar na WNBA. Também tenho um grande sonho que é ganhar uma Olimpíada. Penso muito nisso.

Sobre a autora

Débora Miranda é jornalista e editora do UOL. Apaixonada por cultura. Acredita no poder transformador do esporte. Ginástica olímpica na infância. Pilates, corrida e krav maga na vida adulta. Futebol desde sempre. Corinthians até o fim.

Sobre o blog

Espaço para as histórias das mulheres no esporte, mostrando como a atividade física pode transformar vidas e o mundo. A ideia é reunir depoimentos sobre determinação, superação e empoderamento. Acima de tudo, motivar umas às outras. Vamos juntas?