Eliminar Petrix do BBB 20 é suficiente?
"Eu não quero mais que isso aconteça. Em nenhum esporte, em nenhum lugar." A frase do ginasta Petrix Barbosa faz parte da reportagem que a Globo levou ao ar no fim de abril de 2018, em que atletas denunciavam o técnico Fernando de Carvalho Lopes –agora banido do esporte– por abuso sexual.
Petrix foi o único que concordou em falar com a reportagem mostrando o rosto. Ele contou em detalhes o que passou a partir dos 10 anos com o treinador, que costumava tocar o pênis dos alunos em situações diversas. A reportagem, na época, citava cerca de 40 denúncias. O trauma fez com que muitos deixassem a ginástica artística e até mesmo não tivessem mais vontade de praticar esportes.
A relação entre um técnico e uma criança é de confiança e deveria ser inviolável. Petrix sofreu anos em silêncio, sem contar nada aos pais. Só saiu do clube em que treinava com Lopes aos 13 anos. Teve uma carreira relativamente bem-sucedida no esporte, mas desde que decidiu levar a público o que havia enfrentado, não encontrou mais tantas oportunidades. Especialmente porque fez questão de deixar claro que "todo o mundo, em qualquer clube do Brasil, sempre soube disso".
As portas foram, aos poucos, se fechando para o atleta, que decidiu, então, aceitar o convite da Globo para participar do BBB 20. Mas, desde que entrou no confinamento, Petrix vem causando mal-estar e desconforto. Mensagens acusando-o de assédio e hashtags pedindo sua saída se espalharam pela internet em mais de um momento. A indignação por ver uma vítima de abuso sexual sendo desrespeitosa –para dizer o mínimo– com mulheres foi generalizada.
Não é fácil assistir a um homem, em rede nacional, tocando e chacoalhando os peitos de uma mulher ou sentando na cabeça de outra, esfregando nela seu pênis. É, sim, abusivo. Mas como pode o abusado virar abusador? Pode e não é raro. A repetição de padrões e comportamentos é comum.
Petrix também apresentou aos telespectadores do reality uma repertório inacreditável de masculinidade tóxica, junto dos colegas de confinamento. Já reclamou que na casa ninguém era bonita, que não havia "novinhas".
Pode parecer difícil compreender, mas pense em duas coisas: 1. Trata-se de um homem que vem de um esporte em que, no Brasil, os atletas são frequentemente estigmatizados; 2. Um homem que, quando criança, foi abusado por seu técnico e já revelou que ouvia piadas a respeito no meio da ginástica artística.
Essa é a máquina de formar homens abusivos que o Brasil –e o mundo do esporte– criou e da qual muitos ainda se orgulham.
Compreender, no entanto, não é sinônimo de aceitar. E não deve ser. A cena de Petrix rebolando o pênis na cabeça de uma mulher está entre as coisas mais desprezíveis já mostradas na TV. A Globo começou a se preocupar –o canal, afinal, tem responsabilidade sobre o conteúdo que veicula. Chamou o atleta para uma conversa no confessionário e não revelou ao público o conteúdo do que foi dito. O apresentador Tiago Leifert afirmou apenas que ele havia sido advertido. O ginasta, então, desculpou-se com as mulheres do BBB.
Hoje Petrix está no paredão. E, pela má repercussão de seus atos, provavelmente deve ser eliminado na próxima terça-feira. Mas apenas colocá-lo fora do jogo é suficiente? Tirá-lo da nossa televisão, cancelá-lo nas redes sociais e condená-lo ao limbo dos homens deploráveis é suficiente?
Situações como a de Petrix são complexas, profundas e têm muitos lados. Se queremos de verdade transformar padrões e mudar comportamentos, precisamos entender isso. Precisamos, claro, cobrar responsabilidades. Mas precisamos também encarar o desgosto de frente, entender os motivos pelos quais essa engrenagem social roda do jeito que roda. E não repetir padrões.
Afinal, a gente, como Petrix, não quer mais que isso aconteça. Não quer mais violência, não quer mais abuso, não quer mais machismo.
Em nenhum esporte, em nenhum lugar.
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