“Um dia você está no céu; no outro, no inferno”, diz goleira campeã
"Eu não queria ir. Disse para o meu pai que o gol era muito grande, porque eu estava acostumada a jogar futsal." Luciana Maria Dionizio ainda se lembra da primeira peneira de que participou, no Atlético-MG. Ela começou no futebol por influência do pai, que jogava aos finais de semana e costumava levá-la com ele.
Foi ele também que disse que ela não deveria ter receio do gol grande do campo e que a incentivou a participar da tal peneira –em que ela foi aprovada e que marcou o primeiro passo de sua vida profissional. "Comecei a jogar por causa dele e do meu irmão. Eles sempre me incentivaram, sempre me levaram com eles quando iam jogar e nunca me proibiram de nada", lembra.
Agora, aos 32 anos, Luciana é goleira da Ferroviária, de Araraquara. A equipe venceu o Corinthians —o mais vitorioso time de futebol profissional do mundo, com 34 vitórias seguidas— na final do Brasileiro, há duas semanas. E a vitória passou pelas mãos de Luciana.
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Depois de um empate sem gols, a Ferroviária venceu o jogo nos pênaltis. A corintiana Ingrid desperdiçou uma cobrança, e Luciana defendeu quando Tamires, craque da seleção brasileira, chutou. Uma faixa no estádio celebrava Luciana como "a melhor goleira do mundo".
A função, ela diz, é desafiadora. "Um dia você está no céu, outro dia, no inferno. Mas eu gosto. Quem joga na linha tem o respaldo de todo o mundo, mas, quando a bola passa da defesa, só sobro eu. E nessa hora tenho que conseguir ajudar a minha equipe. É uma posição ingrata, mas é gostosa", define Luciana.
"Eu estava bastante confiante para a final do Brasileiro e entrei bastante concentrada, pois sabia que seria um jogo difícil. O Corinthians é uma bela equipe, mas eu vinha sentindo que o jogo seria definido nos pênaltis. Quando a Tamires cobrou, tentei esperar o máximo para sair junto com ela na batida."
O título a goleira dedicou ao pai, seu grande incentivador, que se recupera de um problema de saúde. "Foram dias difíceis. Meses atrás meu pai teve um AVC. Mas as meninas me deixaram tranquila em relação a tudo. Meu pai está bem e minha mãe também. Vou levar esse título para eles."
Por pouco Luciana não desperdiçou o talento de goleira jogando na linha. "Quando comecei a jogar, comentei com meu irmão que não queria mais ficar, porque tinha que correr muito e eu nunca gostei de correr. Foi aí que decidi ficar no gol."
Ela comemora a evolução do futebol feminino e o investimento de times importantes na categoria. "Depois da Copa, especialmente, mudou bastante. Até a ida do torcedor ao estádio vem crescendo. E a tendência é melhorar mais e mais. No passado, sofremos muito para ser reconhecido."
O que ainda falta, segundo a goleira, é visibilidade. "A TV aberta transmitir os nosso jogos não apenas nas etapas finais, mas durante todo o campeonato. É importante abrir essa porta para o futebol feminino, até porque isso também vai atrair outras coisas, como patrocinadores e mais investimento", conta ela, que lembra dos períodos difíceis.
"Muitas vezes não tínhamos um campo decente para treinar, já jogamos por uma passagem de ônibus, faltava água, bola, tudo. Tem time que ainda sofre com isso", conta Luciana, que teve passagem pela seleção brasileira em 2015, 2016 e neste ano.
O pai, ela conta, morre de orgulho de sua trajetória. "Ele fica bastante feliz e sofre em dias de jogos. Depois, dá a opinião dele, diz o que achou da minha atuação, sempre dá algum palpite."
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